Com seu terno preto bem
cortado, ele estava confortavelmente instalado na grande poltrona de sua
biblioteca. Com a ponta do indicador e o médio, brincava com os próprios
lábios, em movimentos quase infantis. Mas era de uma sutileza tão grande, que
mal podia se dizer, que aquilo fazia parte de um jogo de excitação. Com a
cabeça baixa, olhava para ela com um ar de que algo muito maldoso poderia ser
feito nos próximos minutos.
Ela estava lá. Parada em
frente à janela. Aquele fim de tarde em que o minuano cortava a alma com seu
gelo impiedoso, não existia dentro daquele cômodo. Ela estava lá, e parecia a própria imagem do
paraíso. Seu corpo desenhava uma silhueta envolvente que fazia da luz da janela
um holofote que previa o espetáculo a seguir. Ela estava lá... de costas para
ele. Olhava sem enxergar o outono do outro lado do vidro. Mordia o lábio
inferior só de pensar no que iria acontecer nas próximas horas.
Ele continuava atônito pela
imagem que a janela produzia iluminando aquele corpo. A mão já não estava mais
acariciando o próprio lábio. Sentado um pouco distante de seu desejo, ele
esticou o braço direito e apanhou uma caixa de madeira muito bem trabalhada,
que descansava na mesa ao lado da poltrona. Na outra mão, havia uma enorme taça
com o resto de conhaque que, mesmo flambado, não estava mais tão quente.
Ela estava lá. Parada e sem
esboçar nenhum movimento corporal. Um lindo vestido de tecido fino realçava
suas curvas. Sabia como poucas ser a mulher certa. Os cabelos negros
contrastavam com sua pela extremamente branca e linda. E mesmo com a sala de
livros impregnada pelo cheiro do cravo e açúcar queimados, usado para flambar o
conhaque, seu cheiro característico era mais forte que qualquer perfume. Lindo,
suave e perfeito.
Ele, ainda sentado, apanhou
a caixa, acariciou e abriu. Tirou lá de dentro um cubano Ramon Allones. Com o
cortador, se livrou da ponta do charuto e furou a outra extremidade. Apanhou um
Zippo de aço escovado e acendeu com movimentos circulares. Não tragou. Apagou
depois de uma degustação superficial. Fez todo o ritual sem tirar os olhos
dela.
Ela estava lá. Desta vez,
olhou para trás por cima do ombro esquerdo. Encarou seu admirador com paixão.
Seus olhos denunciavam a medida exata da excitação que tudo aquilo representava.
Ele levantou-se e caminhou
em sua direção. Abraçou com delicadeza pela cintura e a puxou com mais força
para perto de seu corpo. Estavam perto demais.
Dava para sentir o pulso de
cada um dos dois na sala ao lado. A respiração descontrolada acelerava a cada
instante.
- A mulher que você é hoje
foi a que eu sempre quis. Disse quase sem emitir som.
- Você sempre foi o homem
que eu quis, o tempo todo.
A resposta poderia ter sido
acompanhada por um longo beijo. Mas ele largou a cintura dela e a puxou pelo
braço. Sentou-se na poltrona e fez com que ela ajoelhasse na sua frente.
O jogo estava apenas
começando.
Ela estava lá. Acariciava os
joelhos do parceiro por cima da calça sem tirar os olhos dele. Ele a puxou com
delicadeza pelo queixo e aproximou sua boca da dela. Perto demais e sem
tocar-lhe. A respiração ofegante era algo ensurdecedor. Para os dois, aquele
som era tão prazeroso quanto a obra máxima de Beethoven.
Ela estava lá, em seus
braços, submissa, delicada, frágil, entregue. Pronta para ser a peça que ele
desejasse no jogo que ele propunha a cada toque. Todo o comando era dele.
Quando finalmente a beijou,
sentiu todo aquele corpo mudar de dimensão.
Ela estava lá. Completamente
ouriçada. Havia se entregado há muito tempo.
Quando ele estava prestes a
realizar as próximas etapas de seu jogo, um barulho ensurdecedor preencheu todo
o cômodo.
Ele despertou, olhou para o
lado e não tinha ninguém. Mas era impossível que existisse alguém ali. A cama
de solteiro de um adolescente de 16 anos não comportava.
Sem desligar o despertador
que emitia o som que o acordou, pulou da cama, correu para o banheiro escovou
os dentes e colocou o aparelho ortodôntico.
Olhou para o espelho,
retirou o excesso de creme antiespinhas do rosto e correu para sua BMX.
Enquanto ele pedalava freneticamente em direção ao primeiro dia da semana de
provas do colégio, um sorriso no canto da boca metálica coloria aquela manhã de
segunda-feira.
Ela estava lá, no seu
imaginário. Sempre esteve e sempre vai continuar ali, até o dia do encontro.
De volta ao seu quarto, não
era mais possível ouvir o barulho ensurdecedor que o havia acordado. No
aparelho, apenas piscava o horário marcado na noite anterior: 07:15.
Cabeça cheia de sonhos... devaneios sensuais com sua musa... esculpida por formas eruditamente feminina... e quanto mais platônicos seus amores, maior ainda era fome de uma realidade instaurada. Assim é um garoto em formação pisco-viril... Assim fui eu, assim como só eu vi e mais ninguém viu!... Este foi o melhor texto da autoria de Jefferson Rocha que já li. Parabéns pelas explanações sutis, nas descrição exata do desenvolvimento de tantos caráteres viris.
ResponderExcluirBacana,interessante saber q os homens tb são sonhadores na juventude.Mantêm a pose de intocáveis e sutilmente não confessam este lado mais explícito entre as mulheres :)
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